terça-feira, janeiro 20, 2009

O presidente


Um momento histórico; cheio de simbolismos deixados de lado pela cegueira da imprensa brasileira: é minha impressão da posse de Barack Hussein Obama como o 44º presidente estadunidense, primeiro afrodescendente.
Acompanhei todo o processo pela TV e pela internet. No tubo, alternei entre CNN, GloboNews e uma ou outra zapeada pela Globo e Record. Na rede, acompanhei as manchetes de Estadão e Folha.
Tudo o que podia ser dito sobre a importância desse dia na história da política americana - e por que não, mundial - já foi dito, então vou poupá-los de mais uma análise pessoal ou repetições maçantes.
Quero concentrar palavras na lição de jornalismo que tive hoje, vinda da CNN, na figura da equipe comandada por Wolf Blitzer e Anderson Cooper, jornalistas experientes e grandes analistas políticos. Jornalistas, acima de tudo.
Quero contrastar alguns momentos da cobertura desse canal com a dos canais e websites brasileiros, a título de curiosidade.

1 - Durante a entrada dos convidados especiais que atenderiam à cerimônia, a CNN tinha um time de jornalistas analisando personagens e história política das figuras mais imporantes. Globonews, na figura da incomparável Cristina Lobo, dizia gracinhas sobre os modelitos de algumas das presentes e se excitava com a presença de Steven Spielberg e Denzel Washington.


2 - Durante o juramento - um dos mais importantes momentos da cerimônia - o Juiz Federal responsável por tomá-lo de Obama cometeu um erro grave: inverteu a segunda frase, causando um certo desconforto da parte do presidente, e comentários sarcásticos da CNN. Nas palavras dos repórteres e comentaristas da rede: "Cagou". Nas palavras da Globo, Folha e Estado: ...silêncio.

3 - Após um grande discurso proferido pelo presidente empossado, a CNN se apressou com análises sobre pontos importantes e sutilezas encontradas a saber:
- A crítica ao governo Bush nos quesitos educação, fomento à ciência e saúde. E a exarcebação do medo por parte daquela administração.
- As citações claras a momentos da história da luta pelos direitos humanos dos anos 60. Ele chega a citar um hino muito usado nas manifestações do período.
- Os paralelos feitos com os desafios dos grandes presidentes da história e os desafios que tem que ser enfrentados agora.
Manchete do site da FSP após o discurso ( muito após essas análises serem feitas ). "Obama endureçe discurso contra terroristas".

4 - Já na parada, um ônibus branco surge entre uma banda e outra. Wolf se apressa em exigir que alguém descubra de que se trata. Não se passaram 2 minutos para informarem que se tratava de uma homenagem a Rosa Parks, costureira de Detroit que se recusou a dar seu lugar no ônibus a um branco, na década de 50. No Brasil?...

Coincidentemente, terminei ontem a leitura do fantástico "Fama e Anonimato" de Gay Talese. Aula de jornalismo investigativo, o livro ensina que quem não suja os sapatos não conta histórias. As redes e jornais brasileiros parecem ter medo de sujar os sapatos. Dispõe de aparato naquele país mas se restringem a comprar as imagens e analisá-las do estúdio. Flashes da GloboNews mostravam o belo estúdio em Nova Iorque, onde uma jornalista insípida dizia o que estava vendo da janela. No Jornal Nacional, Giuliana Morrone andava com a multidão, falando do tempo, do frio que fazia. Tudo muito jóia, tudo muito legal. Fez metade do trabalho, sujou os sapatos.

É sintomática a falta de preparo de boa parte dos jornalistas brasileiros. Eu não quero ser acusado de jogar confete na cobertura da CNN. Houve momentos em que eles também estavam deslumbrados, senão com os fatos, com a tecnologia que apresentavam pela primeira vez. Mas posso dizer que vendo a cobertura deles eu aprendi. Tinha conhecimento ali. Muito além das pessoas que enfrentaram o frio do Jornal Nacional, muito além do discurso duro que a Folha viu, muito além dos risinhos da Cristina Lobo (Lobo, Wolf...sacaram??) no GloboNews.


Em tempo: A Folha conversou com o professor Carlos Melo, do Ibmec, que contou pra eles como o discurso de Obama estava repleto de simbolismos. Eles resolveram ouvir e mudaram a manchete. Clap, clap, clap.


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