terça-feira, maio 29, 2012

Da imprensa, do juiz e do Lula



Em terra de cego, quem tem um olho é rei. Tem uns, porém, que têm olho mas preferem não ver. São os ditos piores cegos. Aqueles pra quem não importa a luz dos fatos, pra quem cai melhor a escuridão da ignorância e do preconceito. É pra esses que escrevo agora, sabendo que não vou ser lido.

Faz tempo que digo que São Paulo é terra de cegos. Desde 1994 insistem que o melhor para eles é ser governados por um partido que não é partido. Que não tem programa, não tem plano; porque o plano desse partido é o entreguismo, o estado mínimo, a via fácil: "lavamos as mãos, entregamos tudo para a iniciativa privada, e posamos de eficientes".

Esse partido também conseguiu emplacar um desconhecido na prefeitura da maior cidade do país. Isso foi logo depois de um dos maiores expoentes desse partido ter saltado de banda da cadeira municipal para alçar vôos mais altos. Expoente esse que sentou na cadeira logo depois da prefeita Marta Suplicy.

A mesma Marta Suplicy que teve peitos para brigar com  a máfia dos transportes para implantar um sistema único de cobrança de passagem. Que implantou o CEU e levou educação de qualidade - período integral, com teatro, música e piscina - para a periferia.

Mas a população de SP só lembra de Marta por ter trocado o Suplicy por um argentino e por uma frase infeliz. Maior caso de Geni na política nacional, não há.

Corta para 2012. A população de SP parece finalmente cansada de falácias e promessas - de Metrô, de anel viário, de ciclovias - e pronta para votar no candidato do PT. É o ciclo democrático, acontece em todo lugar.

Em SP, porém, não pode acontecer. Porque o PT é, e sempre foi, a desgraça de SP.

Gênios do Instituto Millenium e das redações de jornais e revistas vinham matutando: "como podemos impedir que essa tragédia se abata sobre nós?". A resposta veio de um encontro.

Um mês atrás, Lula foi visitar Nélson Jobim na casa do ex-ministro da Defesa. Jobim é notório adversário do Petismo. Assumiu com a pasta da defesa em 2007 porque assumiu - jogada política de Lula? Competência pura e simples? Assumiu.

E Lula foi visitar Jobim.

Na casa de Jobim estava Gilmar Mendes. Que um mês depois, quase como em um caso de assédio moral,  achou por bem dizer que foi cooptado por Lula para que intercedesse junto ao Supremo para que o Tribunal máximo do país adiasse a votação do Mensalão.

Mendes, indicado por FHC, tem um currículo invejável com vários recordes de concessão de habeas corpus para suspeitos de corrupção.

A Veja deu ouvidos para o juiz. Até aí, nenhuma novidade.

Desde a entrevista à Veja, Gilmar já deu pelo menos três versões dos fatos em entrevistas para outros veículos. Veja uma delas, para a Globonews.


Hoje, o ministro lembrou-se de mais um trecho da entrevista. Dessa vez ele se lembra de ouvir o nome de Paulo Lacerda, ex-diretor da PF que, segundo ele, teria sido contratado pelo PT para encontrar informações contra ele.

Para quem não é cego, essas pataquadas bastariam para enxergar que Mendes, mais uma vez, brinca com a opinião pública.

Nem precisaríamos lembrar que Jobim já disse que Lula foi à casa dele, encontrar com ele - e não com Gilmar Mendes - e que em nenhum momento ele ouviu Lula sequer mencionar a CPI. Depoimento, aliás, que não teve destaque algum nas manchetes ou nos telejornais, ficando relegado aos labirintos do jornalismo cibernético.

Mas tem cego que não quer ver. Que prefere dizer que a defesa da verdade não passa de histeria lulista.

Também deve ser histeria lulista apontar que São Paulo tem 16 de suas 31 subprefeituras entregues nas mãos de coroneis aposentados, muito dispostos a descer o cacete em qualquer um que interfira na "ordem pública". Obra de Kassab.

Também deve ser histeria lulista lembrar que Marta Suplicy aprovou, em 2004, um plano de investimentos que previa 200 km de corredores de ônibus. Projeto devidamente engavetado pelos seus sucessores, especialmente o José Serra, para quem mais ônibus significa mais trânsito.

Esse garçom, meus amigos, é um histérico defensor da verdade de que 18 anos de governo do PSDB na minha cidade e no meu estado não provocaram nada mais do que caos, atraso e a volta de uma repressão que nem no sonho do mais ferrenho anti-petista se tornariam realidade.


segunda-feira, maio 07, 2012

Quando morre um garçom


O Segundo Clichê é um bar ao lado de casa; foi um dos primeiros abrigos etílicos em Brasília. E o Greg foi o primeiro garçom que me atendeu.

Coisa de garçom, Greg começou me tratando com a frieza típica destinada aos clientes de primeira viagem. Como conquistar garçons é um dos meus esportes preferidos, logo dobrei o sujeito que em algumas visitas já sabia da minha cachaça preferida e não passava na minha mesa sem um ou dois dedinhos de prosa.

Na sexta-feira fiquei sabendo de outro garçom, o Renato, que Greg tinha falecido:

- Cadê o Greg? - perguntei. O rosto do Renato apagou.
- Você não tá sabendo?

E eu entendi.

Quinze dias antes, numa sexta-feira, Greg tinha ajudado a fechar o bar às duas da manhã e tinha pego carona - como sempre fazia - com um amigo que morava próximo, em Valparaíso. No carro também estavam dois funcionários do Beirute, outro bar próximo.

No trevo de Valparaíso, um taxista bêbado e em alta velocidade fechou o carro onde estavam os homens, que capotou.

Greg tinha 32 anos. Deixou mulher e um filho de seis anos.

Descanse em paz, camarada.

Sobre viradas e cultura



Estou longe de SP desde a edição passada da Virada Cultural e não é sem uma pontinha de inveja que imaginei os amigos fazendo sua programação, marcando os shows imperdíveis, se encontrando "na catraca do metrô tal à meia noite". É bonito ver milhões de pessoas se mobilizando para ver e sentir arte, ocupar a cidade. 

Com um pouco de atraso resolvi falar sobre o assunto. Atraso que pode até ser bom; uma leitura pra ressaca do evento, que tal?

Li em algum lugar alguém, de quem não lembro o nome, dizer que a Virada Cultural devia ser a cereja do bolo das políticas culturais da cidade. Concordo, assino embaixo.

Na minha São Paulo utópica a cultura acontece todos os dias e, em muitos casos, sem a necessidade de carimbo da prefeitura, do governo estadual ou federal. Acontece e ponto. Apoio das esferas do governo? Sempre bem-vindo. Intervenção e uso político? Nunca!

Política cultural envolve uma porrada de coisas, de transporte público diuturno a segurança. Mas não envolve repressão e fechamento de bares e casas noturnas.

Política cultural envolve criar mais áreas verdes na cidade. O caso do terreno vazio da rua Augusta, por exemplo, não devia chegar nem perto de virar polêmica: a área deve virar um parque. Ponto. Ou você acha que SP precisa de mais supermercados e shopping centers?

Cidades existem para serem ocupadas e ocupação depende, entre outras coisas, de deslocamento. Uma cidade como São Paulo, que vira e mexe é comparada às grandes capitais mundiais como Nova Iorque e Tóquio, deve para seus habitantes um sistema de transporte que funcione durante toda a madrugada. Faça isso e não vai demorar para você observar o número de acidentes causados por motoristas bêbados cair consideravelmente.

São Paulo já tem uma vocação cultural tremenda. Cabe ao próximo prefeito entender que vocação existe para ser desenvolvida, não imposta. Arte não pode ter dia nem hora marcada pra acontecer.