sexta-feira, agosto 31, 2007

Todos os bares deviam ter balcão abaixo do nível da rua

Estava cambaleando por uma rua que não conhecia e a cada passante perguntava por um lugar para uma saideira. "Cada passante" no caso foram dois caras no espaço de quase um quilômetro. Nenhum dos dois sabia. Ou falava.
Afinal, numa esquina, luzes vindas de algo que parecia um porão. Me aproximei mais e vi vultos de cabeças circulando num ambiente esfumaçado. A fumaça podia bem ser poeira dos vidros, mas detalhes...detalhes. Tinha esse sujeito mal encarado na entrada do lugar que me deu um cartão branco com um número e abriu uma porta. Adentrei uma espessa camada de fumaça (era fumaça) e murmúrios e meus olhos arderam, achei bom acender um cigarro também.
Na bruma distingui o que parecia um balcão, atrás do balcão tinha alguma coisa que parecia um cara limpando copos, na frente deste algumas camadas de pessoas.
Afastei algumas camadas e berrei ao "cara-de-fumaça" :
- Ei! Me dá uma cerveja!
- Qual delas?
- Me dá qualquer uma...
- OK - disse, dando uma piscada e me estendendo uma Guiness. Cara estranho. Preciso tomar cuidado aqui.
Resolvi encostar num balcão na frente de uma das janelas que vi do lado de fora. Ao contrário do lado de lá, do lado de cá se via tudo, não que tivesse muito pra se ver.
Um vulto senta na banqueta do meu lado, deve ser uma mulher pelo cabelo e pela saia que estava usando.
- Tem fogo aí cara? - era mulher, estendi o isqueiro enquanto voltava a olhar pela janela. Ela acendeu o cigarro e por um momento a fumaça ficou mais clara.
- Que que você tá olhando aí nessa janela?
- Nada, não tem nada pra olhar
- Você quer ver a minha bunda?
- Difícil ver alguma coisa com essa fumaça, amoreco.
- Não sai daí
Não deu um minuto eu vi aquele rabo de saia do lado de fora, na janela na minha frente. Sem maiores cerimônias virou de costas e levantou a saia. Era uma bela bunda, se te interessa saber. Baixou a saia e voltou para o lado de onde tinha vindo.
Esperei ela voltar um bom bocado de tempo e nada. Resolvi pegar outra cerveja, dessa vez do outro lado do balcão, pra evitar problemas e garantir minha integridade física. No caminho reparei: tinha janelas como a minha circundando todo o bar. Numa delas, do lado de fora, uma bunda conhecida. Do lado de dentro um babaca com cara de bobo. Dane-se! Uns tem a bunda, outros a cara de babaca.

quarta-feira, agosto 15, 2007

15 de agosto de algum ano aí

Aconteceu. Foi mais rápido do que o tempo que você leva para ler este parágrafo. A Coréia do Norte achou de peitar os EUA, que acharam de responder à altura (2 metros e meio mais alto, diga-se). A Rússia achou que não podia ficar atrás. E Índia e Paquistão, seguidos por Israel e outras potências nucleares, resolveram arregaçar as mangas. Uma grande banana para anos de diplomacia.
Naquele boteco no centro da cidade, a nata: dois estudantes universitários, um garçom, um mendigo conhecido (atraído pela hora de fechamento e esperançoso na xepa que se anunciava), o músico que esperava o cachê da noite e o dono do bar. Olhavam incrédulos para a TV, portas baixadas.
O silêncio foi quebrado pelo mendigo, bêbado, antes de qualquer outro que compartilhasse da situação etílica:
- Putz! Fodeu!
Risos nervosos. Copos baixados. Murmurinho. O "doido" tinha razão: fodera. Não o doido, o mundo.
Portas baixadas, dizia, e não demoraram os brindes:
- Quero ver o presidente dizer que não sabia!
- Sou o dono da maior biblioteca do mundo! Um livro! Um livro!
- Ao ócio amanhã!
- Ao fim do mundo!
Se olham. Fim do mundo.
Sentam-se, que estavam de pé já fazia tempo. Um dos estudantes pensa e se sente ridículo por querer ligar pra casa. Outro se sente ridículo por não querer ligar. O devaneio começa com eles:
- Quantos filhos você queria ter?
- Eu queria um casal...e você?
- Eu queria quatro, mais se possível.
- Você tá é besta...sabe a quanto anda a fralda?
- Ô garçom, traga aí uns amendoins e mais uma gelada já que não tem jeito.

Garçom olha para o dono do bar, que consente, calado. O mendigo se manifesta mais uma vez:
- Ah...eu sabia que ia dar merda. Quantas cervejas tem aí?
Todos se olham. Garçom, limpando a mesa, inclusive.
- QUANTAS CERVEJAS TEM AÍ, PORRA!?!?
-T-t-três caixas... - é um misto de choro engolido e preocupação.
- Então fodeu mesmo irmão...a parada é a seguinte: aqui não é alvo pra ninguém...a gente vai morrer é de radiação, ou fome. Essa cerveja aí não vai dar nem pra molhar o bico.

A lógica do mendigo era irresistivelmente...digamos, lógica. O clima de camaradagem apocalíptica (antes que perguntem se existe tal coisa digo que não sei; não tivemos muitos apocalipses ultimamente para aferir a camaradagem existente) deu lugar a olhares desconfiados e rostos sombrios. A cerveja ia acabar, e logo. Era mister garantir o seu quinhão. Melhor era pegar tudo pra si. E dane-se se eram 3 caixas de serramalte, caras à beça. Em tempos escatológicos a gente tem um pendura garantido, paga-se lá, no além ou na próxima vida, o que vier primeiro.

Luzes se apagam.